Sentimentos vivenciados por puérperas durante o pós parto

Fevereiro 15, 2015. Extraído do Artigo Original da Revista de Enfermagem UFPE Online – Por Flávia Andréia Pereira Soares dos Santos, Maria Helena Soares da Nóbrega Mazzo, Rosineide Santana de Brito


Sentimentos vivenciados por puérperas durante o pós parto

Introdução

A gestação, o parto e o puerpério compreendem fenômenos fisiológicos, como também correspondem a momentos da vida feminina, nos quais ocorrem as mais intensas mudanças orgânicas, corporais, psicológicas e culturais. Durante essas fases, a mulher procura o serviço de saúde em busca de ajuda, com vistas a ter resposta aos seus anseios e preocupações. Assim sendo, é necessário encontrar ambiente acolhedor e uma assistência técnica competente e humanizada. Os princípios do Programa de Humanização do Parto e Nascimento (PHPN) voltam-se ao atendimento das necessidades da mulher nas diferentes fases da reprodução e recomenda cadastrar a gestante no Sistema de Acompanhamento    do    Programa    de Humanização no Pré-Natal e Nascimento (SISPRENATAL), avaliar o risco gestacional, desenvolver atividades educativas, realizar visitas domiciliares e estabelecer vínculo com a maternidade de referência, na perspectiva de garantir um parto seguro.
O primeiro contato da mulher com o serviço de saúde público deve acontecer na Estratégia Saúde da Família (ESF) onde os profissionais e, especialmente, o enfermeiro,
têm a responsabilidade de acolher a gestante e iniciar o pré-natal o mais precocemente
possível. A gestação caracteriza-se como um período de mudanças físicas e emocionais.
Desse modo, durante o pré-natal, acolher a mulher, apoiá-la e minimizar medos, dúvidas,
angústias e fantasias torna-se imprescindível.

Mediante as particularidades da mulher no contexto da saúde reprodutiva, se faz necessário que o profissional de saúde conduza sua assistência junto à gestante, de modo a prepará-la na concretização de um puerpério saudável, visando seu adequado restabelecimento    tanto    no    sentido anatomofisiologico quanto no psicossocial, pois, no pós-parto, diversos sentimentos se mesclam no cotidiano das puérperas. Nesse período, as mulheres são passíveis de experienciar sensações de vazio, estranheza e vulnerabilidade, podendo levá-las ao limite de suas capacidades. A vulnerabilidade a que estão expostas torna-as mais acessíveis a receber ajuda. Visto isso, a assistência deve englobar    questões    de    ordem    físicas, emocionais e relacionais.

Em todo o período gravídico-puerperal, a mulher vivencia algumas emoções que podem levar a necessitar de cuidado, esclarecimento e segurança para enfrentar essa etapa de forma    harmônica.    Entretanto,    esses sentimentos podem ser agravados quando os profissionais de saúde desconsideram a importância de seus valores, de sua história de vida e lhes negam o apoio requerido no enfrentamento de suas dificuldades. Desse modo, acabam negligenciando a assistência à puérpera, ao se esquecerem de olhar a mãe e compreendê-la em suas precisões. O profissional de saúde, mais especificamente o enfermeiro, ao prestar assistência à puérpera na ESF por meio da consulta de enfermagem no pós-parto, deve estar atento às necessidades biopsicosocioespirituais da mulher requerente de seus cuidados. Entretanto, no cotidiano das unidades de saúde, as ações se voltam ao aconselhamento do planejamento familiar, cuidados com o recém-nascido e aleitamento materno.

– Sentimentos positivos vivenciados pela mulher durante o puerpério
As mudanças de vida após o parto foram vivenciadas por algumas depoentes como uma experiência agradável e prazerosa. Em primeira instância, esse resultado demonstra uma atitude positiva da mãe diante da maternidade. As falas retrataram que a chegada de uma criança no âmbito familiar é uma etapa de mudança sentida por todos, mas, sobretudo, pela mulher. Apesar das alterações ocorridas na fase puerperal, as entrevistadas verbalizaram que experienciar a maternidade é mudar a vida para melhor.

A chegada de um novo membro ao convívio familiar gera modificações, pois traz consigo a reformulação nos papéis e nas regras de funcionamento familiar. O nascimento de uma criança é um acontecimento passível de influenciar, de forma diversa, o equilíbrio eventualmente desfrutado por cada membro da família. Para as depoentes do presente estudo, ser mãe se reveste de intensas mudanças tanto na vida pessoal como familiar. Mediante os depoimentos, concebe- se que o apoio dos familiares e, principalmente, do companheiro, em situações de nascimento, interfere de forma significativa no cotidiano da puérpera.
Neste sentido, estudo demonstrou que, após o nascimento do bebê, a maioria dos pais apresentou um envolvimento emocional positivo durante o puerpério, expresso através das ações do cuidado e envolvimento com a esposa e o filho. Assim, a presença do novo ser reflete no comportamento do casal. Isso leva a considerar o nascimento como fator de mudanças e alterações na vivência familiar, cuja compreensão entre os pais, nesse momento, torna-se essencial.
O modo como o homem entende a sua vivência no ciclo grávido-puerperal contribui para que ele exerça influências positivas na gravidez, parto, pós-parto e aleitamento materno. Nessa perspectiva, considera-se a importância de orientá-lo quanto ao seu direito de acompanhar a companheira nas consultas pré-natal, no momento do parto e pós-parto, favorecendo um maior vínculo dessa paternidade, proporcionando-lhe, assim, condições de entender as mudanças que acontecem nesse período.
As alterações vividas pelas mulheres proporcionaram crescimento pessoal ao perceberem a dependência da criança a elas. Diante    disso,    expressaram    senso   de preocupação, responsabilidade e sentimentos de felicidade, como também satisfação por terem um objetivo de vida concretizado.

Essas    emoções    tendem    a estabelecer o vínculo mãe-bebê a partir do significado que o filho tem para ela. Assim sendo, sob a luz do Interacionismo Simbólico, a efetivação da maternidade advém de um processo de interação, no qual são revelados sentimentos que regem as relações mãe e filho, pois, na perspectiva de atender as necessidades do recém-nascido e frente às responsabilidades maternas, a mulher imputa menor importância a suas precisões. Tal fato leva a compreensão de que a atitude da mulher no puerpério vela possíveis risco maternos.
Diante dessa possibilidade, os cuidados no pós-parto devem ser percebidos pelos profissionais de saúde não somente como uma ação voltada ao bem-estar do recém-nascido mas também como um processo que se expande e reflete nas demais interações e necessidades femininas como mãe, esposa e mulher. Visto isso, é fundamental que, após o nascimento de um filho, ela receba apoio emocional, físico e informacional, na perspectiva de vivenciar o puerpério de forma saudável, trazendo os benefícios múltiplos e extensivos à criança e à família como um todo.

-Sentimentos negativos vivenciados pela mulher durante o puerpério
Após o nascimento do filho, a mulher passa a apropriar-se da nova situação e conscientiza-se de que o bebê é totalmente dependente dela. Desse modo, novas responsabilidades e experiências surgem no seu cotidiano como mãe.

As consequências da maternidade se refletem na fala da entrevistada, quando relata ter havido mudanças no seu dia a dia frente ao desafio de cuidar do recém-nascido, além dos afazeres domésticos. Durante o puerpério, surgem os sentimentos mais amplos de ser mãe e, em função disso, é preciso cultivar a sensibilidade e a paciência da mulher   para alcançar a maturidade psicológica. Assim sendo, poderá enfrentar os problemas e aprender a lidar com as transformações e abnegações advindas do nascimento de um filho.
Após o parto, a mulher tem o seu ritmo de vida alterado, o que implica vivenciar novos sentimentos e situações as quais se vê obrigada a passar, pois a experiência da maternidade a coloca diante de um somatório de sensações percebidas por ela como algo negativo. As experiências negativas podem chegar a situações patológicas como, por exemplo, a depressão puerperal. É uma doença devastadora e paralisante, na qual, muitas vezes, o reconhecimento precoce dos sinais e sintomas é negligenciado por parte dos profissionais de saúde e desconhecidos pela família da mulher. Na assistência à puérpera, o profissional necessita garantir uma avaliação dos aspectos psicossociais que envolvem o período pós-parto, como também a implementação do cuidado de modo holístico a fim de que a doença possa ser detectada precocemente.
Estudo realizado com dois grupos de puérperas evidenciou que havia maior proporção de puérperas com indicativo de depressão pós-parto, as que receberam pouco apoio por parte da família e/ou amigos, quando comparadas às puérperas sem este indicativo. Nesse sentido, a consolidação dos laços afetivos da mãe e do filho e de todos os membros familiares contribui para a prevenção de agravos e doenças. Também considera que o enfermeiro atuante na Estratégia Saúde da Família tem papel fundamental nesse momento pós-parto quanto a prevenção desse mal. Diante de tantas mudanças impostas à mulher, conforme se constatou nas falas das depoentes, a puérpera torna-se vulnerável ao perceber as restrições a sua vida pessoal e social. Dessa forma, o puerpério pode ser vivenciado com sentimento de negatividade pelas perdas, aparentemente, adquiridas com a maternidade. Mediante essa possibilidade, se faz necessário à família estar atenta às precisões    da    puérpera,    levando    em consideração que as atribuições maternas se incorporam aos demais papéis e atividades desempenhados por ela no cenário da sua realidade.
Na abordagem interacionista, a mulher interage com elementos determinados pelo seu papel feminino, seus projetos de vida profissional, pessoal e com as implicações advindas da condição de ser mãe em diferentes dimensões de sua vida. Com base nas falas das depoentes, a chegada de um filho leva a mulher a sentir-se vulnerável, insegura e triste diante do papel exercido no núcleo familiar. Isso é justificável quando se concebe de que o significado maternal se reflete nos sentidos atribuídos por ela ao cuidado dispensado ao filho.
A prioridade é atender oportunamente às necessidades da criança, pois no contexto social, no qual se encontra inserida, cabe a mulher a maior responsabilidade para com a criança, em detrimento ao autocuidado. Visto isso, a puérpera precisa estar com suas condições emocionais organizadas porque o vínculo mãe-filho durante o pós-parto está profundamente relacionado ao progresso da mãe nas fases de aceitação e participação. A sobrevivência da criança depende da proteção, atenção e cuidados prestados pela mãe. Nesse aspecto, a responsabilidade maior é conferida à mãe, cujo desempenho da função é de garantir ao recém-nascido o recebimento desses cuidados. No pós-parto, vários sentimentos estarão se misturando no decorrer desse período. É uma fase na qual a autoconfiança feminina encontra-se em crise. Tornar-se mãe é um momento de transição e demanda reorganização de todos os papéis que integram o autoconceito da mulher. durante o puerpério, ocorre uma mistura de sentimentos vivenciados pela mulher, pois, apesar de feliz, está preocupada, apreensiva, insegura, triste e solitária. Sobre esse aspecto existem relatos de que muitas vezes a mulher não encontra espaço para extravasar seus sentimentos e a ambivalência é vivida no seu íntimo. Frente a essa situação, precisa aprender a lidar com os sentimentos surgidos durante a fase puerperal e atender as suas próprias necessidades.
Vale lembrar que as mudanças corporais ocorridas no pós-parto, a reorganização psíquica quanto ao vínculo com o bebê, o relacionamento interpessoal e familiar, bem como a capacidade de adaptação em desempenhar    esse    novo    papel,    a amamentação, a retomada das atividades sexuais e o planejamento familiar são fatores contribuintes na transformação do puerpério em um período extremamente complexo.
A complexidade desse período se dá, em virtude do entrelaçamento de aspectos biológicos, psicológicos, comportamentais relacionais, socioculturais, econômicos e por questões de gênero. Diante disso, a possibilidade de intercorrências clínicas como anemias, hemorragias e infecções, assim como as altas taxas de morte materna em nosso país, fazem do puerpério um período considerado de risco para as mulheres. Ao tornar-se mãe, a mulher se depara com cenário de transformações psicossociais em sua vida. Essas mudanças requerem dela uma redefinição de papéis e a necessidade de adaptações pessoais, sobretudo, no período puerperal. Nessa fase, se exacerbam as demandas da maternidade, acarretando importantes alterações no seu estilo de vida, com implicações no relacionamento conjugal e na sua vida afetiva e sexual.
As mães iniciam o processo de conhecimento do filho, aprendem a cuidar dele, como também precisam organizar o cotidiano doméstico com a presença de um novo ser. A partir dessa realidade, ocorrem alterações no contexto familiar em função dos novos desafios, visto tratar-se de um momento diferenciado, permeado por sentimentos diversos, dada as condições físicas e emocionais da puérpera. Todos estes aspectos, individualmente ou sobrepostos, resultam em diferentes situações de vulnerabilidade para as mulheres neste período.

Conclusão

De modo geral, tornar-se mãe implica em transformações na vida pessoal e familiar permeadas de emoções e sentimentos de responsabilidade, exigindo da puérpera e da família o planejamento de novos projetos para o futuro. Assim sendo, ao vivenciar o puerpério, a mulher passa a sentir-se responsável pelo bebê e pelas novas atribuições maternas que se somam aos afazeres domésticos.
Essa multiplicidade de papéis impõe uma sobrecarga emocional, a qual, na ausência de apoio, pode transformar esse momento em experiência não prazerosa, além de predispor à mulher a agravos à sua saúde. Mediante essa possibilidade, se faz necessário que os profissionais atuantes na Estratégia Saúde da Família, em particular os enfermeiros, estejam mais próximos da mulher no período grávido-puerperal, como também atentem para as suas necessidades favorecendo o desempenho do seu papel feminino e maternal com tranquilidade e segurança.

Descargue o estudo completo aqui: http://www.revista.ufpe.br/revistaenfermagem/index.php/revista/article/download/5773/11606

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