Deixe-a chorar abraçada em ti

Leticia Barasuol, nenhum filho, auxiliar de escritório, 24 anos

Tudo que sempre sonhei, era ser mãe. Tenho um relacionamento de 6 anos, e o sonho de nós dois era ter o nosso bebezinho.
Assim, quando comemoramos 5 anos juntos resolvemos tentar. Após 2 meses sem o anticoncepcional, no terceiro eu já estava grávida. A família emocionada, amigos felicíssimos. E nós realizados. Quando completei 2 meses começaram os sangramentos. Em uma sexta-feira ao levantar da cama senti um corrimento. E corremos para o hospital. Nada de mais, um sangue velho, o útero estava normal e fechado. Mas fui aconselhada a ficar em repouso fim de semana e ir ao médico na segunda. Estava tudo ok na segunda-feira. Na terça tive um sangramento mais vivo. E tive que internar. Meu médico achava que eu estava me esforçando. Na quinta saí do hospital, não tive sangramento desde a terça. Fiz um ultrassom para ver o bebê,  já podia ver pernas e braços. Iria ficar em repouso 15 dias e tomar até o final da gravidez um remédio para não ter o bebê antes do tempo, e a Progesterona.
Na sexta-feira voltei com um sangramento mais vivo e fino. Fiquei até sábado de manhã e o sangramento não parou. Quando realizei o ultrassom meu bebê estava deitado de lado, sem batimentos.
Senti o desespero tomar meus pensamentos. Nunca pensei que ia acontecer comigo. E o médico do hospital que realizou o exame, saiu da sala sem me dizer nada. Eu não queria acreditar. A enfermeira da ala de partos veio me buscar e me abraçou, que ficou muito triste pois estava torcendo pela minha melhora. Ali eu desandei. Não podia mais segurar o choro. Mandei uma mensagem para minha melhor amiga, que trabalha no hospital, para ir lá correndo. Quando me viu entrou em desespero junto comigo. Era isso que eu queria das pessoas, eu não queria pena e dó. Eu queria que elas sentissem o quanto aquilo doía, não queria que fossem fortes por mim. Só queria que me abraçassem e chorassem. E me deixassem chorar. Me deram calmantes. Remédio para dormir. Até próximo do momento da Curetagem. Me deram uma injeção para dilatar, que senti dores horríveis, tive mais sangramento e mais sofrimento. O anestesista conseguiu me acalmar no centro cirúrgico. Me explicou o procedimento e me apagou. Na sala de observação acordei 2 horas depois. Queria levantar e ir embora, mas o que sentia era que tinham me arrancado algo, doía tudo. Senti muita vontade de urinar. Me deram uma comadre e mandaram eu fazer lá. Deitada, com dor, sofrendo e grogue. Aquilo era um pesadelo. Uma hora depois me levaram para o quarto onde meu amorzão que é minha mãe, estava me esperando. Pedi para me levar ao banheiro, e a enfermeira não deixou, disse que eu ia cair pelo efeito do sedativo. Mas minha mãe me colocou um pijama, e me levou. No momento em que tentei erguer a perna, senti a verdadeira dor. Parecia que meu útero havia sido retirado, era uma dor horrível, e senti ela por 20 dias. Me davam sedativos a toda hora. Mas a minha dor. Só minha, não passava. Pensar que vi meu bebê formado, e depois sem batimentos. É um filme que me passa na cabeça todos os dias.
O pior são as pessoas que tentam em vão falar algo pra tentar amenizar. “vocês são muito jovens, não era para ser agora”, “vocês são novos, logo tentam de novo”, “não acredito que ainda lembra disso! Esquece! ” (essa foi a pior) “6 meses passa rápido daí você pode fazer tratamento para engravidar” (detalhe que não preciso me tratar) “espera um ano ou dois”
Até mesmo meu marido não entende meu sofrimento até hoje, já faz 6 meses. E ele complica por eu lembrar e chorar.  Manda eu “parar de me bobiar, ele vai voltar na hora certa”. Ele me ajuda em muita coisa. Mas no meu momento de luto choro escondida.
O homem precisa do material, ver e tocar. A mãe tem o lado espiritual, o laço entre bebê e mãe é bem diferente. Se você tem sua mulher e perderam o bebê, pelo amoooor de Deus, deixe ela ter o seu luto. Nenhuma mãe merece perder o filho, nem que o tenha visto só por uma pequena tv .
Dê carinho e atenção. Se ela estiver indisposta, vá lá dar um beijo e um cafuné por dois minutos. Lembre que “sovar” a mulher, não é carinho. Ela se sente um lixo quando está triste e você faz isso.
Deixe-a chorar, não brigue com ela, ela precisa que você sofra com ela ou que a deixe sofrer em paz. Se quiser deixe ela chorar abraçada em ti, vá beijando seu rosto, passando a mão em seus cabelos. Ela se sente amada e vai se acalmar.
Mas não se afaste dela, só vai piorar tudo.
Todos me perguntam se já vou engravidar agora, ainda vou esperar uns 4 meses para poder. Psicologicamente estou abalada.  E quero ter meu bebezinho de volta no momento em que ele quiser voltar para mim. E sei que ele vai me dar um sinal que está pronto para receber todo meu amor.

1 comentário Adicione o seu

  1. Poliana de Oliveira disse:

    Querida Letícia

    Sentimos muito que tenha passado por tudo isso. Obrigada por compartilhar conosco sua dor, podemos imaginar o quanto isto lhe dilacerou. Infelizmente em nossa sociedade a perda gestacional é negligenciada, e seu apelo foi muito coerente. Talvez ainda estejam na relação material, como você disse que estão os homens. Precisamos de uma sociedade mas materna.
    Escreva pra gente sempre que precisar, temos um e-mail que pode entrar em contato conosco: equipe@temosquefalarsobreisso.com.
    Sabemos que nada substitui esta perda, mas que isto não lhe impeça de tentar a maternagem novamente.

    Sinta-se abraçada por todas nós
    Poliana de Oliveira
    Conselheira equipe Temos que falar sobre isso

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